Já passou uma semana desde o horrível massacre. Vim contar a minha história, a história do Adir.
Era sexta-feira. Antes do início do Shabat, eu e o Shalev decidimos encontrar-nos às 23h para carregar o carro com todas as coisas e partimos em direção às meninas que moram em Holon, entre elas a companheira do Shalev, a Hodaya, e as suas duas amigas, a Yuval e a Hadar.
Chegada a hora, partimos pela auto-estrada ao som de Omer Adam e haflot (música festiva oriental) do mesmo género. Passámos pela segurança e pela entrada tranquilamente e terminámos a montagem do equipamento e das tendas às 2:30 da manhã. Claro que antes de tomarmos uma bebida forte, fomos verificar o ambiente na pista de dança. Estávamos todos divertindo-nos e entusiasmados.
No caminho de volta para a nossa tenda, vi o meu cunhado Din com o seu grupo e decidimos encontrar-nos logo de seguida. É difícil para mim explicar as primeiras três horas de festa. Resumirei isto dizendo-vos apenas que foram as três melhores horas que já vivi numa festa. Um ambiente de amor, generosidade e liberdade! Com os nossos amigos de Petah Tikva, o meu cunhado e os seus amigos! O que é que pode ser mais divertido do que isso?
“O DJ diz ao microfone: “Amigos, a festa acabou; há alerta vermelho, vão para casa.” Ficamos chocados, sem termos noção de que estamos envolvidos em algo real."
Às 6:30 da manhã, todos aqueles que encontram-se na pista de dança desatam a correr pelas suas vidas. Exatamente três minutos depois de o DJ desligar a música, ouvimos interceções de mísseis e alertas vermelhos ao fundo. O DJ diz ao microfone: “Amigos, a festa acabou; há um alerta vermelho. Vão para casa!" Ficamos chocados, sem termos noção de que estamos envolvidos em algo real. Entretanto, tentamos fugir e esconder-nos. Depois de alguns minutos corremos para a tenda, juntamos as nossas coisas, levamos apenas o essencial e corremos para o carro. Ligo para a minha mãe e digo-lhe: “Está tudo bem. Há alerta vermelho. Estamos bem, a caminho do carro. Vamos para casa”.
Entrámos no carro e seguimos em direção à auto-estrada. Durante o caminho começamos a ouvir rajadas de tiros, ainda sem entender que estávamos no início da guerra. Havia um engarrafamento na entrada da auto-estrada e todos abandonaram os seus carros e desataram a correr para salvar as suas vidas ao mesmo tempo que se ouviam constantemente mísseis e tiros. Sentimo-nos como se estivéssemos num filme de terror, mas ficámos no carro até vermos o carro ao nosso lado perfurado por balas e uma mulher saindo aos gritos: “A minha perna! Eles atingiram-me!”. Assim que ouvimos isso, troquei um olhar com o Shalev e saímos do carro, gritando: “Meninas, saiam! Agora!". Fugimos em direção ao campo aberto, para onde um oficial de alta patente do exército disse-nos para irmos. O Din estava perto dele e gritou para nós: “Rápido! Deitem-se no chão e saiam daqui!” Essa foi a última vez que vi o Din naquele dia.
Enquanto corríamos e escondíamos-nos em arbustos e árvores, terminei uma garrafa de água e enfiei-a na relva junto a uma planta alta e seca; não sei por que motivo. O Shalev, as meninas e eu andámos vagueando perdidos pelos campos durante cerca de uma hora. Estávamos todos num estado caótico, gritando e chorando. Passada uma hora, avistei a partir de outra direção a planta e a garrafa. Disse então que tínhamos de recuperar os nossos sentidos. Abri um mapa e vi que a Sul encontra-se Re’im. Não podíamos ir para lá. A Oeste fica a Cisjordânia, a Leste encontra-se um campo vazio e a Norte fica Be’eri. “Então iremos para Be’eri, o kibutz mais próximo, onde podemos nos proteger”.
Durante o caminho para Be’eri, formou-se uma distância entre mim, o Shalev e a Hodaya, e fiquei apenas com o Yuval e a Hadar. Enquanto fugia de terroristas, falei com o pai da Yuval e acalmei-o. Ele perguntou-me para onde é que eu estava indo. Expliquei-lhe que o kibutz mais próximo é Be’eri e assim que ele ouviu isso, disse-me: “Não vá para Be’eri! Há uma infiltração em Be’eri!”. No momento em que ouvi isso, comecei a gritar para todos em redor: “Não vão para Be’eri! Não vão para Norte! Há uma infiltração em Be’eri!”. Depois disso, mudámos de direção para Leste. Vi no mapa que existe um antigo posto das forças segurança chamado Sumra. “Vamos tentar chegar lá.”.
Fiquei terrivelmente receoso de que escurecesse. Estava ao telefone o tempo inteiro, conversando com os pais de toda a gente enquanto fugíamos dos tiros e rezando para que alguém nos encontrasse e ajudasse. Às 10h30, a minha mãe pediu-me uma atualização e então disse-lhe: “Vimos alguém que nos disse que deveríamos seguir rumo ao assentamento de Patish; não se preocupe.”. Convencia-a de que estavam lá forças policiais e do exército para mantê-la calma. Nesse momento, morreu o meu telefone. A Yuval e a Hadar estavam histéricas. Não larguei mãos delas nem por um segundo.
Por fim, enquanto íamos bebendo a partir dos sistemas de irrigação e corríamos para salvar as nossas vidas, chegámos ao assentamento de Patish. Havia um guarda armado e garrafas de água à nossa espera no abrigo e sentimos-nos um tanto seguros. O Shalev e a Hodaya estavam atrás de nós. Então fui procurá-los a pedido de Yuval. Não consegui encontrá-los, mas alguns minutos depois de ter chegado, eles vieram e abraçámos-nos e chorámos. Eles haviam chegado a Beit Ha’am no assentamento de Patish uns 20 a 30 minutos depois de nós.
Uma rapariga chamada Yamit ofereceu-se para levar-nos até a sua casa e cuidar de nós - um autêntico anjo do céu. Fomos com ela para a sua casa. A mãe e a sogra dela cuidaram de nós e abraçaram-nos, mas ainda assim sentíamos-nos péssimos. Os nossos amigos foram feridos e alguns deles não conseguiram voltar. Nós só queríamos dançar!
Por volta das 14:30, o meu tio, depois de escapar à polícia e aos bloqueios de estradas - o assentamento de Ofakim ainda estava bloqueado -, acabou por chegar e levou-nos. Ainda não tínhamos digerido aquilo porque passámos nem sabíamos de nada.
Por volta das 17h, chegámos a casa em segurança. Estamos aqui para viver e contar a nossa história!
Peço desculpa por não ter conseguido incluir tudo e ter omitido muitos incidentes ao longo do caminho. Agradeço a Deus por trazer-nos a casa em segurança e à Yuval e à Hadar, que me ajudaram a não entrar em pânico, incentivando-me a lidar com a situação da melhor maneira possível. O Shalev e a Hodaya formam um casal incrível e o Shalev cuidou sempre dela.
O meu coração está com os reféns, as famílias dos mortos e os feridos. Que Deus ajude-nos. Venceremos esse mal. O Povo Eterno não teme o longo caminho que tem pela frente.
Adir E.